22/01/2014

Existe fórmula para criar um garoto-propaganda de sucesso?


Quando o assunto é escolha de um garoto-propaganda, o caminho mais óbvio e objetivo para as marcas e agências é contratar astros e personalidades para protagonizar campanhas e promover produtos. Mas e o caminho contrário? Como transformar um rosto desconhecido em uma poderosa personificação da marca? Mesmo com toda a riqueza de sua fauna criativa, repleta de Leões, a propaganda brasileira ainda apresenta poucos cases nessa matéria. Figuras como o “Garoto Bombril”, o “Sebastian (Abuse e Use) da C&A” e o “Baixinho da Kaiser” são fenômenos inesquecíveis, mas igualmente raríssimos.

Atualmente, nas propagandas da operadora Vivo, um novo rosto tem ganhado cada vez mais espaço e conquistado o público com seu carisma. O ator João Cortês, que começou sua relação com a marca contracenando com a global Grazi Massafera, roubou a cena no comercial em que tentava insistentemente falar com a atriz e ganhou novas chances. A partir daí, apoiado pela criação da Y&R e outras atuações interessantes, o “Ruivo da Vivo” virou protagonista nas campanhas da marca.
O Adnews conversou com dois mestres na arte de construir um personagem de sucesso. Um deles é nada mais e nada menos que Washington Olivetto, Chairman da WMcCann e CCO da McCann Worldgroup, e que ao lado do saudoso Francesc Petit  criou o “Garoto Bombril” em 1978, com o ator Carlos Moreno, que foi parar nas páginas do Guinness Book como o garoto-propaganda de maior tempo de permanência no ar, a partir do décimo sexto ano de execução e mais de 340 filmes.
“A criação de um personagem é sem dúvida nenhuma uma dos maiores prazeres do criativo. Ela dá chance ao profissional de criar um patrimônio único e original. Evidentemente a base da construção de um grande personagem está na presença de uma ideia forte e uma grande conexão com o produto anunciado. Outro processo importante é estabelecer muito bem o perfil e as características do personagem e buscar um ator que consiga incorporar essa personalidade. Feito isso, o criador também precisa pensar sempre no processo de condução e administração da biografia desse personagem. Tem que ativar a sua capacidade de imaginar o passado, o presente e o futuro”, explica Olivetto.

Outro “PHD” no assunto é Woody Gebara, hoje presidente de sua agência Woodycom, mas que trabalhando para a Avanti, house a agency da C&A, e integrando um time que contava também com Ralph Choate e Waldir Costa, foi o responsável pela criação do Sebastian, o eterno “Abuse e Use” e o primeiro garoto-propaganda negro da publicidade no Brasil. “O desafio do brifieng era criar uma campanha hard-sell, mas que ao mesmo tempo fosse fashion, irreverente, inovadora e diferente. Pela conexão da marca com a classe C, desde aquela época (1990), já me veio à cabeça um Brasil afro-brasileiro, que representa a maioria no País. O primeiro comercial foi inspirado numa clássica cena de “Blues Brothers” (Os irmãos cara de pau), em que o cantor Cab Caloway animava uma grande plateia com a música “Minnie The Mutcher”.  O Sebastian incorporou todo esse conceito com sua presença e carisma e foi um sucesso”, relembrou Woody.
Para Olivetto, o segredo da longevidade do Garoto Bombril está relacionado com a capacidade de se reinventar, algo possível por dois fatores básicos; a condução da biografia do personagem e a própria versatilidade do ator Carlinhos Moreno. “O personagem misturava a persuasão da propaganda com a atualidade do jornalismo. Ele sempre explorou todas as possibilidades do universo de comunicação, incluindo essa relação com o factual. Mas, é preciso dizer também que o grande mérito do próprio Carlinhos Moreno. Ele conseguiu ser muitos, sem deixar de ser ele mesmo. O Garoto Bombril já foi bem-humorado, mal-humorado, racional, emocional, musical, entre tantos outros estados de espírito e isso é fantástico”, ressalta.
E o cliente nesse processo de construção? Para Woody, ele é fundamental. O publicitário conta uma história interessante que, ao lado da capacidade criativa das campanhas, contribuiu muito com a consolidação do Sebastian e do slogan “Abuse e Use”. “O maior mérito foi do cliente. E também tivemos um pouco de sorte. Acontece que a C&A autorizou a verba de criação para o ano inteiro dez dias antes do Plano Collor, que congelou o passivo público e causou uma enorme redução no comércio e na produção industrial e que impactou a propaganda. Em uma semana produzimos 37 filmes. Com as verbas de outros clientes reduzidas, o comercial da C&A se destacava bastante nos intervalos da televisão brasileira”, confidenciou.
Woody Gebara também destacou os cuidados necessários para a preservação da imagem do personagem. “É preciso evitar o desgaste. Colocávamos o Sebastian apenas para anunciar as coisas mais importantes. Ele tinha que aparecer nos momentos mais nobres para não ficar algo repetitivo”, afirmou.
Além disso, embora seja mais difícil emplacar, preterir um rosto desconhecido como “garoto-propaganda” aparentemente pode custar menos. Mas nem sempre é assim, alerta Woody. “O custo com mídia pode ser maior, já você precisa de tempo e várias inserções para construir e consolidar um personagem. Se a demanda for imediata, o caminho mais fácil é contratar alguém já conhecido. Sem contar que é preciso ser muito criterioso na escolha, já que essa pessoa vai representar a marca. Geralmente os artistas já tem mais consciência de seu papel como garoto-propaganda”.
Mas será que o desafio não aumenta com a velocidade das redes sociais e novas mídias e contribuí para esse desgaste? Para Olivetto não. “Pelo contrário. Essa velocidade na mudança de processos só facilita. A necessidade de reinvenção fica ainda mais clara. O processo de criação e condução do trabalho é que é essencial e que vai fazer a diferença”, pontua o Chairman da WMcCann, que diz ter observado o “Ruivo da Vivo”. “É um personagem simpático e pelo que percebi já faz um grande sucesso. A característica mais interessante nele é a questão da fragilidade, do anti- heroísmo, e isso gera empatia com o público”, avalia.
Para finalizar, questionado sobre como seria um garoto-propaganda representando o Brasil, ele disparou: “o Brasil seria um anti-herói. Ele consegue surpreender negativamente e ao mesmo tempo ser fantástico quando se menos espera. Seria um personagem com o fator falibilidade muito intenso e isso gera bastante conexão com o público, já que ninguém é perfeito”, concluiu.

Por Renato Rogenski

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